quarta-feira, 24 de abril de 2013

"O Caso Oppenheimer" na Aliança Francesa

Espetáculo: O caso Oppenheimer
Autor: heinar Kipphardt
Diretor: Jean-Luc Descaves
1965, abril, Teatro Aliança Francesa


"O Caso Oppenheimer" na Aliança Francesa

Bastava a leitura desta peça de Heinar Kipphardt para se ter a impressão da sua debilidade como texto escrito para ser transformado em espetáculo. Se “O Caso Oppenheimer” nos coloca perante a flagrante atualidade de problemas cruciais para a consciência universal (e isso é um mérito extraordinário) sua realização, porém, nos pareceu, desde logo, extremamente difícil quando fosse testada no placo. A comunicação das ideias teria de fazer-se com recursos cênicos que a peça não pressupunha. O diretor teria de recriar elementos demasiadamente estáticos, de natureza muito verbal. A ausência de situações, a complexidade dos problemas propostos à inteligência (e cultura) do espectador, a dificuldade em seguir o ritmo das palavras sem as poder repensar, a carência de uma dinâmica que as explicasse pela imagem, tudo contribuiu para tornar dificílima, fatigante, sem significado, uma peça muito importante, muito oportuna e muito válida. Assistimos ao julgamento de Oppenheimer, o “pai da bomba atômica", acusado de traição aos Estados Unidos só porque tem escrúpulos de consciência e recusa sua colaboração na invenção de uma bomba ainda mais mortífera e terrível para a humanidade, sem que uma tomada de posição venha garantir ao espectador se é ele que está com a verdade. Tudo resulta confuso e pastoso. A peça se esvazia de conteúdo no decurso do seu lento desbobinar. Os personagens não se caracterizam na dimensão dramática de uma realidade crítica que já pertence à história contemporânea. Jean-Luc Descaves renunciou a essa tomada de posição e mostra-nos apenas um julgamento comum, com o mínimo de solenidade burocrática, como se ele intencionalmente se omitisse à recriação que lhe competia realizar e se limitasse a apresentar-nos o texto literário, servido na bandeja do palco, com Heinar Kipphardt como único responsável. Nem sequer utilizou todos os recursos que a peça indica. Teve receio de interceptar o longo, e por vezes fastidioso, desenrolar das ideias, com imagens e som que promovessem uma pausa para o espectador repensar.

Se Descaves tivesse evitado todos estes obstáculos e fosse servido por um grupo de atores mais homogêneo o espetáculo seria bem diferente. Seria melhor. Treze homens em cena é um problema. É preciso que cada um e todos realizem um trabalho que seja de per si e no conjunto, uma afirmação mais profunda da arte de representar. Jairo Arco e Flexa, por exemplo, que é um ator de mérito, veste a pele de Oppenheimer, mas jamais consegue ter o peso, a solenidade e a força que a grandeza do personagem possui. E os outros atores são levados a seguir a mesma linha superficial. Talvez uma exceção em Rubens de Falco e Paulo Vilaça. Estão mais ajustados à distribuição conferida pelo diretor, o que não acontece com a maioria dos outros. Há outra exceção ainda. Mas aqui a responsabilidade não é só de Descaves. É também de Ferreira Leite. Seus recursos, marcadamente acadêmicos, deram uma sugestão muito pessoal de um personagem que não é da peça, mas resulta como se fosse.

Apesar de tudo isto, “O Caso Oppenheimer” deve ser visto. Mais: deve ouvir-se com toda a atenção. Deve meditar-se e deve ser apoiado como espetáculo que serve, não obstante, a todos os que têm o hábito de pensar e que amam a dolorosa procura da verdade.


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